Caça aos mensaleiros!

     O mensalão foi um desastre. Um vulcão incontrolável que, expelindo sua ardente brasa nos provava um teorema: existe lava por dentro da Terra. Deixa que eu explico: ele foi o escândalo que teve que acontecer pra lembrar ao povo brasileiro que a corrupção não só existia no centro da nossa política, como provar também o quanto era quente e destruidora.

     O mensalão foi um atentado contra a república, contra o balanceamento proposto pela divisão dos três poderes, contra o bom funcionalismo da máquina pública. O mensalão foi um grande atentado, não terrorista – como estamos acostumados – mas, também mortal, mortalmente silencioso, arquitetado e sussurrado pelos salões e alcovas da capital federal.

      Muito bem planejado e tão bem sussurrado que dele sequer suspeitamos por muito tempo. Acontecia sob os nossos narizes. “Dormia, a nossa pátria mãe tão distraída, sem perceber que era subtraída em tenebrosas transações“ como bem disse Chico Buarque, e como tão bem citou Gurgel em seu discurso de acusação no plenário do Supremo Tribunal Federal.

     Roberto Gurgel que, aliás, finalmente mostrou porque é o procurador-geral da República. Antes completamente inapto ao cargo, por sua falta de vigor e por ser “fraco com os fortes”, o simpático Dr. Gurgel enfim deu a cara à tapa e desceu do pedestal para acusar os bandidos, para mostrar as provas e, finalmente, pedir que fosse feita a justiça no injustiçado Brasil.

     E justiça significa pôr atrás das grades os culpados – se forem considerados culpados. É mostrar ao povo brasileiro que a impunidade pode ser combatida, que a corrupção pode ter seu fim e que foram válidas as manifestações populares que ocorreram à época do mensalão. Mostra ao povo que o Brasil pode seguir um novo rumo que, embora difícil, é possível.

     Para isso, é preciso que o Supremo julgue com idoneidade cada um dos membros deste grupo. É preciso que os ícones do movimento (José Dirceu, José Genuíno, Delúbio Soares, Roberto Jefferson, Marcos Valério) caiam da mesma forma que os desconhecidos. E é preciso também que o presidente Lula cale a boca e deixe a justiça cumprir com o seu papel.

     Porque, sem dúvidas, é inaceitável ver o homem que teve seu cargo de presidente posto em xeque por esse escândalo, hoje sair em defesa do seu amigo José Dirceu – sem mostrar prova alguma da sua inocência – em uma ação que previa até mesmo o adiamento do julgamento que hoje é realizado pelo órgão máximo da justiça brasileira, e seus ministros.

     Da mesma forma que é inaceitável ver o presidente Fernando Henrique Cardoso mostrar-se tão contundente em seu ataque ao mensalão, quando em seu próprio governo viveu um escândalo semelhante (a compra de votos para a emenda que daria o direito de reeleição aos presidentes da república em 1997) que possibilitou a sua continuidade no poder – reeleição.

     A justiça tem que se postar no olho do furacão que é a briga entre os falastrões presidentes e, baseado em provas, julgar. Esse talvez seja o julgamento mais importante do supremo desde aquele que tinha como réu Fernando Collor de Melo. E, tal como o escândalo que o chutou da presidência, hoje temos um fato que deve mudar o destino da nossa pátria.

     Seus filhos, hoje entretidos com novelas, futebóis, e olimpíadas, não podem entregar-se ao sono profundo que permite aos ladrões executar o seu dom nato de roubar. Seus filhos têm que lutar, e não deixar-se calar por aqueles monstros que nascem e se reproduzem por solo verde-amarelo. Hoje é dia de mudança, e amanhã também será. Lutemos, brasileiros!

     E se lutarmos, poderemos dizer aos corruptos em uníssono, algum dia, que estamos bem, obrigados. Mas, enquanto isso não acontece, certamente continuaremos escrevendo que a coisa aqui tá preta, e que aqui na terra estão jogando muito futebol, que tem muito samba e que a gente anda bebendo, pois que sem a cachaça ninguém segura esse rojão.

“Pai, afasta de mim esse cale-se!”
(Chico Buaque de Hollanda)

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